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Laço Azul e Laço Vermelho



Conto de fadas que Lars contou para a filha,
adaptado para a nossa variante da Língua Portuguesa.



"Era uma vez, há muitos anos atrás, uma linda menina que era amada pelos seus pais e que prendia seus longos cabelos com dois laços, um azul e outro vermelho. Certo dia ela teve de seguir sozinha pelo escuro caminho que atravessava a velha floresta, mas mal pisando na trilha ela tropeçou numa raiz e caiu em cima de uma velha faca enferrujada, que atingiu seu coração, partindo-o em dois.

Mas em vez de morrer, a menina foi dividida - pois caíra sobre uma velha faca mágica perdida há séculos - em duas meninas idênticas, do mesmo tamanho, rosto e voz, iguaizinhas ao que ela era antes. Elas também estavam vestidas com as mesmas roupas da menina de outrora, e única diferença entre elas era que uma tinha os cabelos na metade da altura do que era antes, mas com o laço vermelho fazendo apenas um rabo de cavalo com os cabelos do lado esquerdo, e a outra também com cabelo na metade da altura, mas com o laço azul prendendo só um rabo de cavalo, mas do lado direito da cabeça. A menina do laço vermelho era corajosa demais e não tinha medo de nada, mas a menina do laço azul era medrosa demais e tinha medo de tudo.

"E agora, como vamos voltar a ser uma só? Como vamos nos apresentar ao Rei Fora da Floresta assim?", perguntava Laço Azul, que é assim que ela começou a se chamar a partir de agora. "Eles não vão acreditar que éramos uma só, vão rir de nós, nos expulsar do castelo e nos entregar aos ogros e bruxas!".

"Eu não tenho medo e vamos nos apresentar ao Rei assim como somos agora!", respondeu Laço Vermelho, que era o nome da outra menina. "Baterei em todos que rirem de nós, baterei nos ogros e baterei em qualquer bruxa que aparecer! Vamos!". E pegou um velho galho de árvore e seguiu a estrada. E apesar de ter muito medo para continuar, Laço Azul decidiu ir atrás de Laço Vermelho, por ter mais medo ainda de ficar sozinha, e ambas seguiram a viagem.

Quando chegaram ao primeiro terço da trilha, uma velha bruxa apareceu, horrenda, ameaçadora e andrajosa. Ao ver tal mulher, Laço Azul se escondeu e Laço Vermelho avançou para atacá-la sem aviso ou motivo. Mas como era uma criança, foi pega pele gola pela bruxa, que não era fraca assim, e jogada para junto de Laço Azul.

"Quem são vocês, irmãzinhas", perguntou a bruxa, "que se vestem de forma tão igual? Responda, menina de laço azul".

"Não somos irmãs, bruxa", respondeu Laço Vermelho, a que nunca tinha medo de nada, "éramos uma única menina que foi divida em duas por uma faca mágica." E Laço Azul, por ter medo, não respondeu a pergunta que era dirigida a ela e ficou atrás de Laço Vermelho.

"Eu tenho o dom de fazer vocês duas uma só novamente", disse a bruxa, "mas como Laço Vermelho foi muito mal-educada e me atacou sem motivo, e como Laço Azul foi mal-educada e não respondeu a pergunta que fiz a ela, não vou ajudar. Adeus". E a bruxa desapareceu numa explosão com cheiro de enxofre.

"E agora, como vamos voltar a ser uma só?", se perguntaram.

"Vamos voltar", disse Laço Azul, "a floresta é cada vez mais escura e perigosa, e eu tenho medo!"

"Vamos avançar", disse Laço Vermelho, "a floresta é cada vez mais escura e emocionante, e eu não tenho medo!"

E apesar de ter muito medo para continuar, Laço Azul decidiu seguir Laço Vermelho, por ter mais medo ainda de ficar sozinha, e ambas seguiram viagem. Quando chegaram ao segundo terço da trilha, um lobo apareceu, imenso, faminto e de olhar assassino. Ao ver tal animal, Laço Azul - que era medrosa - se escondeu sem pensar e Laço Vermelho - que era corajosa - atacou sem pensar também, e logo foi engolida inteira pelo animal, numa só bocada. Logo o lobo farejou Laço Azul e, paralisada de medo, ia ser engolida também quando a bruxa reapareceu e matou o lobo, salvando Laço Azul de ser engolida.

Mas a bruxa não era boa, pegou Laço Azul pela mão, levando-a para casa. Lá obrigou a menina - que não tinha coragem de fugir nem de desobedecer nem de enfrentar - a trabalhar para ela. Todos os dias ela tinha de fazer as refeições e limpar a casa toda, que era escura e imunda, mas só podia comer os restos das refeições da bruxa, e seu lugar de dormir era em cima de um tapete sujo e gasto entre o fogão e as vassouras.

Já Laço Vermelho, que não tinha medo, nem estava morta, mas também não tinha forças para sair de dentro da barriga do lobo morto, ficou presa lá dentro um tempão, até conseguir sair de volta pela boca do animal. Como estava imunda, se lavou num córrego que havia ali perto e em seguida, mesmo dentro da barriga do lobo ela tinha ouvido a bruxa levar Laço Azul, foi procurar por sua outra metade.

Naquele mesmíssimo momento, Laço Azul estava sozinha na casa da bruxa, cercada de montanhas de panelas e pratos encardidíssimos para lavar, e viu que a porta da casa da bruxa estava aberta. Juntou toda sua pouca coragem e saiu, para fugir... chegando lá fora, porém, teve medo da grandeza e do silêncio da floresta e voltou correndo para seus afazeres. "Ela me maltrata, mas ao menos aqui estou segura dos perigos que se escondem nas sombras lá fora", se lamentou enquanto desencardia um caldeirão. E no dia seguinte a porta estava aberta de novo, ela fez a mesma coisa, mas andou um pouquinho além antes de correr apavorada de volta para a casa da bruxa. E no dia seguinte, mais um pouquinho, e foi assim todos os dias.

Logo Laço Vermelho encontrou a casa da bruxa, mas essa ficava do outro lado de uma ponte, e a ponte tinha um Guardião impedindo a passagem para o outro lado. Como Laço Vermelho não tinha medo de nada, correu e atacou o Guardião com um galho, mas foi facilmente repelida. "Diga as palavras e te deixarei passar, Laço Vermelho". Mas Laço Vermelho fingia não ouvir, descansava e juntava forças antes de fazer um novo ataque. "Ele é maior e mais forte do que eu, mas não tenho medo dele", pensava. E depois de algumas horas descansando, voltou a atacar de novo e foi rechaçada da mesma forma, com o Guardião dizendo a mesma mensagem todas as vezes, "diga as palavras e te deixarei passar, Laço Vermelho". E foi assim por muitas vezes seguidas...

Até que certa vez a Laço Azul sentiu-se suficientemente segura para ir embora da casa da bruxa e não voltar mais. Era meio dia e todas as sombras da floresta estavam menores e menos ameaçadoras. Isso aconteceu ao mesmo tempo em que Laço Vermelho decidiu mudar de atitude e perguntou quais eram as palavras ao Guardião da ponte, em vez de tentar forçar sua passagem para o outro lado da ponte. "As palavras são, minha jovem, 'por favor'".

E no instante que Laço Vermelho pediu "por favor" para o que Guardião liberasse seu caminho através da ponte, e foi atendida, Laço Azul apareceu na outra margem. As duas se encontraram no meio do caminho, se abraçaram, comemoraram e imediatamente voltaram para a trilha, logo alcançando o fim dela. E no fim da trilha havia uma grande muralha de espinhos, alta demais para ser escalada, larga demais para ser contornada, profunda demais para ser afastada facilmente. E atrás da muralha facilmente se via o castelo do Rei, onde elas queriam chegar desde o começo.

"Essa muralha me dá medo, mas temos de chegar lá", disse Laço Azul.

"Não tenho medo dessa muralha, mas ela é um obstáculo considerável", disse Laço Vermelho.

Então Laço Azul empunhou uma pequena espada - que tinha encontrado na casa da bruxa para se defender - e bateu com ela na muralha, cortando alguns espinhos e folhas. E antes dela levantar os braços para cortar mais espinhos, Laço Vermelho também veio ajudar e ambas começaram a fazer um caminho por dentro da muralha de espinhos. Elas se arranhavam, se cansavam, se ajudavam e avançavam sempre. Até que, sem perceber, chegaram do outro lado da muralha. Ou melhor, ela chegou ao outro lado da muralha: não existia mais Laço Azul nem Laço Vermelho, eram uma só novamente, a menina com os dois laços no cabelo que existia até o começo da história.

E rapidamente ela chegou ao castelo, se apresentou ao Rei Fora da Floresta e contou sua aventura ao monarca. E como esse rei gostava de histórias, premiou a menina com tesouros por causa da singularidade do seu relato, por agora ser prudente e educada. Logo ela voltou para casa pelo mesmo caminho, mas isso é outra história para outro dia. De qualquer forma, ela chegou lá e viveu feliz para sempre."



[continua..?]





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